Evangelho Puro e Simples - Doce Revolução

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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

O ínico da ganância no Brasil - uma breve abordagem histórica


Na minha incansável busca reflexiva sobre as bases da globalização e sistema capitalista que impulsiona as pessoas ao consumo desenfreado e ao desejo de ter coisas, novas coisas, mais coisas e contrapondo essas questões aos ensinamentos de Cristo, além de observar e analisar pregações dotadas de um método psicológico-retórico para a conversão a um Deus "dono do ouro e da prata", acabei por identificar em "O Povo Brasileiro: A formação e o sentido do Brasil" de  Darcy Ribeiro algumas informações valiosas para a análise desse problema que acaba ludibriando muitos achados "cristãos" que, em verdade, cultuam seus bens e dinheiro.


Na formação do povo brasileiro, muitos grupos étnicos estiveram envolvidos, macroculturas em processos de aculturação contínuo (até hoje, já que a cultura é dinâmica).
Aqui vou me ater às questões relacionadas aos índios e aos europeus, a fim de contribuir pra uma visão histórica do processo.  

Vou trazer algumas passagens do livro que me fizeram fixar os olhos e quase perder o chão...

Vejamos:

Para introduzir o tema e abrir nossas mentes, preciso reforçar a pluralidade cultural dentro da nossa própria cultura que é dotada de uma unidade étnica básica. Somos uma sociedade multiétinica, uma macroetnia com poucos resquícios de microetnias...

"Como estabelecer a forma e o papel da nossa cultura erudita, feita de transplante, regida pelo modismo europeu, frente à criatividade popular, que mescla as tradições mais díspares para compreender essa nossa nova versão do mundo e de nós mesmos?" (RIBEIRO, 1995, p. 16).

O povo europeu, personagem ímpar no processo de formação da identidade do povo brasileiro, aparece, dentre outras coisas, com uma emergente vontade de "converter" os índios aos dogmas católicos.
"Abre-se com esse encontro um tempo novo, em que nenhuma inocência abrandaria sequer a sanha com que os invasores se lançavam sobre o gentio, prontos a subjugá-los pela honra de Deus e pela prosperidade cristã. Só hoje, na esfera intelectual, repensando esse desencontro se  pode alcançar seu real significado" (RIBEIRO, 1995, p. 44).

No decorrer da invasão dos portugueses e na dominação forçada aos índios, esses foram "domesticados" à "verdade" português e o que aconteceu foi que "Os recém-chegados eram gente prática, experimentada, sofrida, ciente de suas culpas oriundas do pecado de Adão, predispostos à virtude, com clara noção dos horrores do pecado e da perdição eterna. Os índios nada sabiam disso. Eram, a seu modo, inocentes, confiantes, sem qualquer concepção vicária, mas com claro sentimento de honra, glória e generosidade, e capacitados, como gente alguma jamais o foi, para a convivência solidária." (RIBEIRO, 1995, p. 45).

Por que será que Darcy enfatizou sobre a convivência solidária que não existia em outros povos? Talvez para explanar que não seria necessário a pregação "céu x inferno" para fazer alguém generoso...

E essa fala me faz refletir que as incansantes buscas por glória e bens materiais afastavam os europeus (e afastam todos) da simplicidade que é viver em Cristo (o qual deveria/deve ser o centro de toda pregação).

Existe um diálogo da página 45 e 46 que é essencial para entender a fundo o problema.

Vejam:

Aos olhos dos índios, os oriundos do mar oceano pareciam aflitos demais. Por que se afanavam tanto em seus fazimentos? Por que acumulavam tudo, gostando mais de tomar e reter do que de dar, intercambiar? Sua sofreguidão seria inverossímil se não fosse tão visível no empenho de juntar toras de pau vermelho, como se estivessem condenados, para sobreviver, a alcançá-las e embarcá-las incansavelmente?
Temeriam eles, acaso, que as florestas fossem acabar e, com elas, as aves e as caças? 
Que os rios e o mar fossem secar, matando os peixes todos?

(Fascinante!!!)

 "Os nossos tupinambás muito se admiram dos franceses e outros estrangeiros se darem ao trabalho de ir buscar os seus arabutan. Uma vez um velho perguntou-me: Por que vindes vós outros, maírs e perôs (franceses e portugueses) buscar lenha de tão longe para vos aquecer? Não tendes madeira em vossa terra? Respondi que tínhamos muita, mas não daquela qualidade, e que não a queimávamos, como ele o supunha, mas dela extraíamos tinta para tingir, tal qual o faziam eles com os seus cordões de algodão e suas plumas.
Retrucou o velho imediatamente: e porventura precisais de muito? - Sim, respondi-lhe, pois no nosso país existem negociantes que possuem mais panos, facas, tesouras, espelhos e outras mercadorias do que podeis imaginar e um só deles compra todo o pau-brasil com que muitos navios voltam canegados. - Ah! retrucou o selvagem, tu me contas maravilhas, acrescentando depois de bem compreender o que eu lhe dissera: Mas esse homem tão rico de que me falas não morre? - Sim, disse eu, morre como os outros.

 Mas os selvagens são grandes discursadores e costumam ir em qualquer assunto até o fim, por isso perguntou-me de novo: e quando morrem para quem fica o que  deixam? - Para seus filhos se os têm, respondi; na falta destes para os irmãos ou  parentes mais próximos. - Na verdade, continuou o velho, que, como vereis, não era  nenhum tolo, agora vejo que vós outros maírs sois grandes loucos, pois atravessais o 
mar e sofreis grandes incômodos, como dizeis quando aqui chegais, e trabalhais tanto para amontoar riquezas para vossos filhos ou para aqueles que vos sobrevivem! Não será a terra que vos nutriu suficiente para alimentá-los também? Temos pais, mães e filhos a quem amamos; mas estamos certos de que depois da nossa morte a terra que nos nutriu também os nutrirá, por isso descansamos sem maiores cuidados (Léry  1960:151-61)." 

Repito: fascinante!

Parece até que ele conhecia os ensinamentos de Jesus, a simplicidade leva a isso mesmo.

Vejam a analogia:

Mateus 6: 26-34

Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas?
E qual de vós poderá, com todos os seus cuidados, acrescentar um côvado à sua estatura?
E, quanto ao vestuário, por que andais solícitos? Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham nem fiam;
E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles.
Pois, se Deus assim veste a erva do campo, que hoje existe, e amanhã é lançada no forno, não vos vestirá muito mais a vós, homens de pouca fé?
Não andeis, pois, inquietos, dizendo: Que comeremos, ou que beberemos, ou com que nos vestiremos?
(Porque todas estas coisas os gentios procuram). De certo vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas estas coisas;
Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.
Não vos inquieteis, pois, pelo dia amanhã, porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.

Igreja Católica: "evangelismo" e escravidão

"[...] se S. A. os quer ver todos convertidos, mande-os sujeitar e deve fazer estender aos cristãos por a terra dentro e repartir-lhes os serviços dos índios àqueles que os ajudarem a conquistar e senhoriar como se faz em outras partes de terras novas [...]   Sujeitando-se o gentio, cessarão muitas maneiras de haver escravos mal havidos e muitos escrúpulos, porque terão os homens escravos legítimos, tomados em guerra justa e terão serviços de avassalagem dos índios e a terra se povoará e Nosso Senhor ganhará muitas almas e S. A. terá muita renda nesta terra porque haverá muitas criações e muitos engenhos, já que não haja muito ouro e prata. [...]

Esse parece também o melhor meio para a terra se povoar de cristãos e seria melhor  que mandar povoadores pobres, como vieram alguns, e por não trazerem com que mercassem um escravo, com que começassem sua vida, não se puderam manter, e assim foram forçados a se tornar ou morrerem de bichos; e parece melhor mandar gente que senhoreie a terra e folgue de aceitar nela qualquer boa maneira de viver, 
como fizeram alguns dos que vieram com Tomé de Souza [...]

Para os primeiros, os índios, então em  declínio e ameaçados de extinção, passaram a ser criaturas de Deus e donos originais  da terra, com direito a sobreviver se abandonassem suas heresias para se incorporarem ao rebanho da Igreja, na qualidade de operários da empresa colonial  recolhidos às missões. Para os colonos, os índios eram um gado humano, cuja  natureza, mais próxima de bicho que de gente, só os recomendava à escravidão (RIBEIRO, 1995, p. 53).

Em suma, o que aconteceu desde sempre é que a ganância do homem aliada ao fato de não conhecer a Cristo e/ou não querer viver a cruz que Ele nos ensina em Sua palavra, leva pessoas a subordinar outras com base numa retórica bíblica que não existe.

Eu consigo fazer um link desse passado remoto com a atualidade futurista, pois hoje nada mudou, até mesmo os "protestantes" que nada protestam, vivem a mesmice de suas vontades próprias e as vanglórias de seus interesses.

É mais fácil, portanto, crer que o Senhor Jesus quer fazer todas as pessoas felizes e prósperas do que crer que Ele nos chamou para negar a nós mesmos, tomar nossa cruz e que nossas necessidades se resumem em comer e vestir.

Que o SENHOR desperte em nós sempre a verdade do evangelho.

A verdade liberta.